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A última pista de atletismo do Plano Piloto


Em 2010, escrevi me despedindo da pista de atletismo que existia no complexo esportivo ao redor do estádio Mané Garrincha, antes dele ser completamente destruído e reconstruído do zero para a Copa do Mundo de 2010. Do antigo estádio, restaram somente a localização e o nome. Do antigo complexo, restaram apenas o ginásio Nilson Nelson, também prestes a ser demolido, e as piscinas do Complexo Aquático Cláudio Coutinho. O que havia além dessas duas estruturas foi completamente obliterado. Virou um imenso e árido estacionamento que pouco tem de serventia ao estádio em si: é utilizado mais como o estacionamento dos ônibus que chegam ao Plano Piloto de manhã e ficam aguardando até a noite para levar os trabalhadores de volta às cidades satélites e ao Entorno, uma das idiossincrasias desta cidade que resolveu o problema da pobreza se livrando dos pobres para bem longe dela.

Às vezes o estacionamento também é usado para abrigar shows de música a despeito de um dos argumentos utilizados para justificar a construção de um estádio com capacidade para 70.000 espectadores numa cidade em que os dois times de futebol com maior torcida disputam, quando muito, a 4ª divisão do Campeonato Brasileiro era justamente que ele haveria de abrigar shows em seu interior. Para continuar fazendo shows do lado de fora a gente não precisava ter gasto quase 2 bilhões de reais. No mais, excetuando-se as vezes que o Flamengo dá o ar da graça em Brasília, a única função do estacionamento que desalojou quadras de tênis, pista de atletismo e velódromo, todos em péssimas condições de manutenção porém ainda com serventia, é aumentar a área impermeabilizada da cidade.

Não tinha sido a primeira vez que a equipe com a qual treinava havia sido desalojada de uma pista de atletismo. Também não foi a última. Na verdade, a minha história de corrida em Brasília também pode ser narrada como a história das vezes que o GDF me expulsou de uma pista de atletismo. Quando essa história começou, treinávamos no interior do estádio. Fomos expulsos ainda antes de sua demolição. Fomos treinar na pista externa até que ela virou canteiro de obras e, mais tarde, estacionamento. Passamos à pista da PM no Setor Policial até que um oficial qualquer encrencou com a nossa presença. Daí conseguimos autorização para treinar na pista do grupamento do Corpo de Bombeiros, também no Setor Policial. Depois de algum tempo a autorização foi revogada e tivemos que sair de lá também.

Em 2013 fomos treinar na caquética pista de brita da UnB. Estávamos lá, felizes e contentes, quando, em janeiro deste ano, soubemos que ela seria fechadas até 2021 para reformas. Mais uma vez, fomos desalojados. Não restou uma única pista de atletismo aberta ao público em todo o Plano Piloto. Com isso, podemos ter a dimensão da importância que o esporte olímpico tem em nossa cidade e, por extensão, em nosso país: nenhuma.

Assim, ficou a questão para as assessorias que treinavam na UnB: onde treinar em Brasília se não restou nenhuma pista de corrida? Depois de cogitar algumas alternativas, o Nonato resolveu usar a pista de kart do Estacionamento do Alpinus, no Parque da Cidade. Não que com isso estejamos disputando espaço com os carros de corrida em miniatura e nos arriscando a sermos atropelados. O termo "Pista de kart" é  utilizado para descrever a função que um dia ela já teve, da mesma forma que a "Piscina de Ondas" do Parque da Cidade já deixou de ser piscina há muito tempo. É apenas um buraco azulejado onde, no máximo, se realizam festas de vez em quando. Hoje está abandonada como em geral estão todas as instalações públicas do Parque da Cidade. Não é exagero dizer que a pista está abandonada há décadas. Eu nunca soube dela ter sido usada em sua função original. Acredito que a memória do último dia em que isto ocorreu tenha se perdido no tempo. Pela quantidade de árvores plantadas ao redor de suas curvas e de suas retas, imagino que tampouco se cogite fazê-la pista de kart novamente.

A pista não é plana. Pudera: não há em Brasília qualquer trecho maior que 100m plano que não tenha sofrido algum trabalho de terraplanagem. Essa história de que "Brasília é plana" é pura lenda. O Planalto Central não é a mesa de bilhar que seu nome sugere. É verdade que não se tem subidas longas. Não se vai encontrar muitos segmentos categoria 2 ou menor por aqui. O padrão do terreno, porém, é ou subindo ou descendo. Numa das vezes que a Wings for Life foi realizada em Brasília ouvi, no ônibus que recolhe os atletas eliminados, um corredor comentando com seu vizinho:

- Quando eu falei que ia correr aqui meus amigos me falaram: "Pô, você vai se dar bem. Brasília é tudo plano". Nunca fiz uma prova com mais subida do que essa!

A Asics e a Run Cities se aproveitam desta característica. Na impossibilidade de se encontrar um percurso de 21 km plano, resolveram tacar a largada lá em cima e a chegada lá em baixo e fazer de suas provas as "meia-maratonas mais rápidas do Brasil".

Quanto à pista de kart, vai ter que dar pro gasto porque foi a única alternativa que nos restou. Só espero que o GDF não descubra esse nosso novo local de treino que é bem capaz dele dar um jeito de nos expulsar de lá também.

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